Popular, populares

Sobre o Evento
Popular, populares chega em momento oportuno: sua abertura coincide com as comemorações em torno dos 20 anos do Museu Afro Brasil, momento de importantes reflexões sobre o acervo dessa instituição, formado em grande medida por obras e artistas ditos “populares”. Essa exposição traz à baila questionamentos que afligem artistas, curadoras e intelectuais de toda cepa, tais como: quem define o que é “popular”?
A ideia de “povo” ainda é possível em nossos tempos? Para nós, essa preocupação desdobra-se, ainda, para o questionamento sobre o que há de negro e indígena nessas produções artísticas e como elas permanecem sendo manifestações sensíveis do imaginário de suas mestras e mestres e, da mesma forma, constituem formas de reproduzir a sobrevivência cotidiana de seus fazedores. Como não poderia deixar de ser, “arte popular” é um conceito espinhoso que carrega as nuances e tensionamentos de décadas de conteúdo reflexivo acerca do nosso ser e existir brasileiros.
Pensando nossa realidade enquanto sociedade historicamente atravessada pela escravidão e pelo colonialismo, esse “povo” assume faces distintas, tão diversas quanto nossa geografia. No campo das Artes com A maiúsculo, esse termo assume ares étnicos, regionalistas, assume também rótulos que enrijecem e, de certa forma, estereotipam o lugar de seus cultores: trabalhadores “humildes”, entendidos como “ingênuos”, com pouca ou nenhuma formação artística “acadêmica” e estudo “formal” em escultura, pintura, gravura, música ou literatura. Essa visão exígua e estreita é exatamente o fio narrativo que pretendemos cindir. E o fazemos a partir de nossa própria coleção, que resiste em se esgotar. Nesse sentido, o “popular” será sempre plural e impassível à reificação. A arte produzida pelas trabalhadoras que criam verdadeiras escolas ou “famílias” artísticas, criam circuitos, rotas e mapas de circulação artística não pode ser resumida num único conceito. Nessa mostra fazemos livre relação entre obras e artistas, revelando as diferentes faces que podem assumir uma peça quando colocada em diálogo. Do universo multicolorido habitado por seres antropo –zoomorfos ao minimalismo das formas, Popular, populares é um convite a uma viagem que se inicia ao adentrarmos os barcos de Exu de Cândido Santos Xavier, passam por memórias íntimas, manifestadas nos retratos e faces esculpidas, como as representadas pela série “Família quilombola” de Mauro Firmino e se encerram no ventre fértil das sereias e de outros seres que povoam o realismo fantástico brasileiro, tal como nos mostram esculturas de Resêndio e Manuel Graciano Cardoso, levando-nos novamente ao início, com as carrancas de Mestre Biquiba Guarany, João Souza e Jezo.