Como a Terra Respira de Isa do Rosário

Sobre o Evento
Nascida no interior, Isa do Rosário foi criada à sombra da frondosa cultura caipira que marca os encontros fronteiriços entre São Paulo e Minas Gerias, terra de solo vermelho e fértil, onde florescem muitas das manifestações culturais que estão na origem da sociabilidade negra, como as Congadas, Folias de Reis e Festas do Divino Espírito Santo. Radicada em Franca, a artista ecoa, faz coro e abre voz com seus conterrâneos Abdias do Nascimento e Mestre Carlos de Assumpção, personalidades com as quais se identifica e se filia na luta, na militância e na poética.
Como artista, Isa não se limita. Desenha, escreve poesias, conta histórias e canta acompanhada de sua viola. Mas é no tecido, bordado e enriquecido com apliques de toda sorte, que ela transforma sua obra num grande portal que atravessa o espaço e o tempo. A escolha de cada desenho, cada detalhe, cada cor, cada linha é soprada em seu ouvido como um presságio, um pedido de outros tempos. A artista, consciente da grandeza de sua missão, coloca suas mãos e sua criatividade à serviço dos que com ela se comunicam: antepassados que enfrentaram a travessia da calunga e padeceram, encantados, entidades e orixás cujas vozes se mesclam às suas vivências e à sua imaginação sensível.
Em Como a Terra Respira, sua primeira exposição individual de peso, temos a alegria de apresentar sua produção mais atual e inédita. Permeada de serpentes - animais que que caminham ondulando e carregam o mistério do mundo, suas obras manifestam sua relação com Oxumaré, orixá da mudança, da maleabilidade, da riqueza ao final do arco-íris e dos ciclos da vida que nos conectam de forma contínua com nosso passado negro. Além das cobras, Isa relembra os cantos das lavadeiras à beira dos ‘corgos’ e riachos, os batuqueiros em dia de festa de devoção, as benzedeiras que curam o corpo o e espírito, de espinhela caída e vento virado a mal olhado.
Incontestavelmente contemporânea, a obra de Isa Rosário dialoga intensamente com o acervo do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, que a recebe como se da casa fosse, como quem abraça um ‘conhecido’ antigo que acabou de conhecer. Tudo nela ecoa e reverbera em traços, fios e lantejoulas em associação livre com uma miríade de pequenos objetos diversos. Cada obra, um relicário.